«Há mais de cinquenta anos, cada camponês tinha a sua própria horta com a qual se abastecia a si mesmo. (...) As crianças regressavam a casa vindas da escola, com os braços carregados de ervas que recolhiam pelo caminho para os seus coelhos. Quase todos os camponeses tinham um porco: "um na pocilga e outro na despensa", costumavam dizer. Estes porcos, galinhas e coelhos davam uma enorme fertilidade às suas hortas, bem como as águas da casa, pois naqueles dias não havia esgotos. A maioria das quintas davam aos seus trabalhadores, uma vez por ano, uma ou duas cargas de esterco que servia para adubar a horta.
Estas hortas eram muito produtivas e de uma grande fertilidade. A ninguém que então vivesse no campo teria passado pela imaginação comprar verduras. (...) a crescente mecanização da agricultura lançou cada vez mais camponeses para as cidades, a maioria destas excelentes hortas deixaram de existir (...), ficando frequentemente, as antigas hortas lavradas com esmero, convertidas em verdadeiros campos de desolação.
Mas agora, o pêndulo oscila de novo em sentido contrário. A alimentação, como tudo, é cada vez mais cara e observa-se um renascer da horta como fonte de auto-abastecimento. (...) Onde há poucos anos havia, em toda a Europa, milhares de parcelas sem serem cultivadas, existe agora uma larga lista de espera para poder adquiri-las. (...) As novas gerações estão aprendendo a trabalhar sem esses produtos (químicos (...)), e recorrem apenas a métodos próprios da natureza. Está a voltar a descobrir-se o valor dos resíduos orgânicos, tanto animais como vegetais. Os métodos de fabricação de adubos compostos e de criar animais voltam a tratar-se como matérias de importância crucial.»
The self-Sufficient Gardener, John Seymour - 1978; Edições Dorling Kindersley Limited, Londres 1978; Traduzido por jardiminhoto da edição espanhola de 1981 - El Horticultor autosuficiente - ISBN 84-7031-244-8.
Estas palavras de John Seymour estão absolutamente atuais. Mesmo se Portugal tem tradicionalmente um atraso relativamente ao resto da Europa, esse movimento já é hoje visível no nosso país.
Há actualmente uma tendência, uma abertura, para uma reaproximação do Homem com a natureza e valorização desse contacto, bem como a valorização das profissões ligadas à agricultura e da vida no campo, como um todo. Considerada já como sendo uma forma de vida de qualidade. Hoje um agricultor já não tem vergonha de o ser, já não é visto como uma profissão menor. Nunca o foi, mas era desvalorizado pela sociedade.
Mais do que nunca, vimos hoje, jovens a lançarem-se em projectos agrícolas. Mas ao contrário dos agricultores antigos, muitos deles iletrados, outros tinham apenas a 4º classe (embora imbuídos dos conhecimentos ancestrais que passavam de geração em geração e que hoje a maioria deles já se perderam, porque os jovens saíram dos campos e os seus pais e avós não tinham a quem passar esses conhecimentos), estes novos agricultores são formados por escolas superiores ou por politécnicos de todo o país. É a geração melhor preparada. Usam técnicas modernas baseadas em tradições ancestrais e lançam os mais diversos e interessantes projectos agrícolas: desde explorações agrícolas de horticultura; vinhas; pequenos frutos; pomares frutíferos; produção de cogumelos; recuperação de variedades regionais de frutíferas e fabricação de cidras e outros produtos com essas variedades, para tornar essa recuperação mais efectiva e sustentável; ervas aromáticas; pomares de oliveiras (para cortiça, madeira, azeite, aplicações medicinais e mesmo na arquitectura e decoração); já sem falar da criação de gado caprino, ovino, cavalar e outros; etc..
Existem já no nosso país, municípios que têm uma bolsa de terrenos para alugar ou vender, e tentam captar jovens dinâmicos para fazer reviver as aldeias e vilas deste país. Há também muitos estrangeiros a comprar terrenos agrícolas em Portugal, mesmo no interior do país e estão a fazer mexer a sociedade local. É uma nova geração, uma nova realidade, que se vai pouco a pouco reintroduzindo nos campos, nas aldeias e acabará, estou certa, por reocupar também as terras e aldeias do interior (até porque são terrenos mais baratos) e voltaremos a ver crianças e jovens nas aldeias. A crescer saudáveis, equilibrados, vivendo em harmonia com a natureza, sabendo dar valor ao património nacional seja ele cultural, vegetal ou outro. E veremos aparecer novas profissões ligadas à natureza e o reforço e valorização de outras quase esquecidas. Nas próximas 2 /3 décadas isso será uma realidade.
Existem já no nosso país, municípios que têm uma bolsa de terrenos para alugar ou vender, e tentam captar jovens dinâmicos para fazer reviver as aldeias e vilas deste país. Há também muitos estrangeiros a comprar terrenos agrícolas em Portugal, mesmo no interior do país e estão a fazer mexer a sociedade local. É uma nova geração, uma nova realidade, que se vai pouco a pouco reintroduzindo nos campos, nas aldeias e acabará, estou certa, por reocupar também as terras e aldeias do interior (até porque são terrenos mais baratos) e voltaremos a ver crianças e jovens nas aldeias. A crescer saudáveis, equilibrados, vivendo em harmonia com a natureza, sabendo dar valor ao património nacional seja ele cultural, vegetal ou outro. E veremos aparecer novas profissões ligadas à natureza e o reforço e valorização de outras quase esquecidas. Nas próximas 2 /3 décadas isso será uma realidade.
O ideal seria que dentro de 30/50 anos fossemos totalmente auto-suficientes e sustentáveis. Isso terá uma repercussão enorme nas nossas vidas, no nosso equilíbrio emocional, nas nossas cidades, vilas e aldeias; nas nossas relações inter-pessoais. Será uma sociedade renovada e a sua construção já começou. Pelo menos parece ser essa a direcção...
Já o grande Eça de Queiroz dizia «A cidade é a ilusão. Nela o homem perde a força e beleza harmónica do corpo e se tornou esse ser ressequido e escanifrado ou obeso de ossos moles como trapos, nervos trémulos (...), sem fibra, sem viço, torto, corcunda. Na cidade findou a sua liberdade moral. Cada manhã ela lhe impõe uma necessidade, o arremessa para uma dependência. (...)Milhões de seres que tumultam na arquejante ocupação de desejar e nunca fartando o desejo incessantemente padecem de desilusão, desesperança ou derrota. Os sentimentos mais genuinamente humanos na cidade logo se desumanizam. (...)Mas o que a cidade mais deteriora no homem é a inteligência (...), são carneiros trilhando o mesmo trilho.» Ele vai mesmo mais longe ao considerar a cidade «uma criação anti-natural onde o solo é de pau e feltro e alcatrão e o carvão tapa o céu, e a gente que vive acamada nos prédios como paninho nas lojas. (...)e o homem aparece como uma criatura anti-humana sem beleza, sem força, sem liberdade, sem riso, sem sentimento, trazendo em si um espírito que é passivo como um escravo ou imprudente como um histrião. Sim, a cidade é talvez uma ilusão perversa.»
Eça de Queiroz - «A cidade e as serras»
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