BUTÃO - O PAÍS DA FELICIDADE INTERNA BRUTA (FIB)

Será possível em pleno séc. XXI viver de um modo diferente da nossa sociedade consumista ocidental e escolher um modo de vida em equilíbrio com a natureza e que não tenha impacto algum negativo  nela? Será que poderíamos substituir o PIB (Produto Interno Bruto) pelo qual trabalhamos, pelo FIB (Felicidade Interna Bruta)? Será que ainda vamos a tempo de repensar os valores da nossa sociedade capitalista ocidental e escolher um outro modo de vida mais em harmonia com a natureza e que nos proporcione maior bem-estar físico e mental ao mesmo tempo que preservamos os recursos do planeta? 



Família real butanesa

O Butão, é um pequeno país do tamanho da Suiça, com cerca de 800 000 habitantes, uma monarquia constitucional, entalado entre a gigante China e a grande Índia. Foi o único país do mundo a inscrever na sua constituição a noção de Felicidade Interna Bruta (FIB) em vez do conhecido PIB (Produto Interno Bruto) e a ensiná-la na escola. O único a ter um Ministério da Felicidade e é também o único a ter uma pegada ecológica neutra (Portugal tem uma pegada ecológica de 2,5 planetas). Inscrito na sua constituição está também que o país deve ter pelo menos 60% do seu território coberto de floresta (em Portugal deixamo-la arder todos os anos). Tem ainda a ambição de ser o primeiro país do mundo com um uma agricultura 100% biológica certificada. Para o governo o bem estar colectivo e a protecção da natureza são primordiais. É contudo um dos países mais pobres do mundo com 23% da população a viver no limiar da pobreza segundo o FMI (Fundo Monetário Internacional), o ordenado mínimo nacional são cerca de 100 dólares. Quase não tem forças armadas, a sua defesa é assegurada pela Índia. Não tem mendigos, índice de violência é muito baixo e não tem corrupção administrativa. O desporto nacional é o arco e a flecha e fazem-se torneios anuais. 50% dos adultos são analfabetos.

Para o 1º Ministro do Butão, a verdadeira felicidade exclui o sofrimento do outro e o meio para atingir isso, é colocar-se ao serviço dos outros. Viver de harmonia com a natureza e aprender a conhecer-se a si mesmo. Quando estas três condições estão reunidas pode-se falar em Felicidade Nacional Bruta e é esse o objectivo a atingir pelo seu governo. Para eles a riqueza de um país não se mede pelo seu crescimento económico mas pelo grau de felicidade dos seus habitantes. Porquê associar a idéia de felicidade à riqueza e crescimento económico? Não existirá outra via para as nossas sociedades? Quão diferente é a mentalidade deste político comparado com os políticos ocidentais.

Este país dá muita importância à educação e à saúde. Tanto uma como outra são gratuitas no país. A educação é financiada por uma taxa turística. O inglês é aprendido nas escolas primárias e mosteiros, tal como a informática ou a matemática e os alunos são também sensibilizados para a meditação, para a plena consciência, para a curiosidade e inteligência emocional. Segundo eles, a educação deve encorajar a abertura de espírito e de coração em vez de formar para a performance intelectual e resultados económicos. 

No Butão a escola tem por objectivo espalhar a felicidade universal através dos seus alunos. A empatia e o respeito são os dois grandes pilares do ensino. Em certas escolas primárias as paredes do recinto escolar em vez de estarem grafitadas com assinaturas e símbolos que nada significam, têm frases escritas nos muros do recreio da escola como «Há muitas coisas que não devemos segregar, regiões, religiões, género, cor e castas» ou «A gentileza começa comigo». As aulas começam com uma breve sessão de meditação. Há muitas maneiras de meditar mas todas têm por objectivo fixar-nos no instante presente, sem pensar no passado ou no futuro.

Os mosteiros são aqui muito importantes, pois são o garante de uma vida tradicional, próximo da natureza. 10% da população vive em mosteiros, havendo cerca de 100 000 monges. Também funcionam como centros de aprendizagem para a vida, pois muitos mosteiros funcionam como centros de recuperação e desintoxicação para jovens delinquentes, que têm a escolha entra prisão ou o mosteiro. Nos dois primeiros meses é difícil para estes jovens mas depois habituam-se às regras. A vida aí começa às 4.30 h da manhã de 2ª a Sábado. Reconhecem que estavam errados e muitos querem continuar depois de curados e ser monges. Para eles a felicidade é ter o espírito em paz, mesmo se não possuem nada. Dizem que se são felizes por dentro isso vê-se por fora. 


Um mosteiro no Butão

É uma instituição tão importante que 1 habitante em cada 7 aí faz um retiro, ao menos uma vez na vida, durante alguns meses ou anos. É único no Mundo. É comum as famílias pobres enviarem um de seus filhos para o mosteiro, para que se torne monge. É uma honra para a família ter um filho monge e é uma maneira de os mandarem estudar quando vivem em regiões mais isoladas. Tal como há algumas décadas as famílias pobres em Portugal enviavam um filho para o seminário, para ser padre. Era um meio de dar estudos aos filhos e uma honra para a família ter um filho padre.

No Butão existe um provérbio que diz «ter um olho no passado e outro na nossa época». Assim, o papel dos monges é de preservar a herança budista, mas ao mesmo tempo, viver na época presente tendo hoje mais direitos que pelo passado. Os mosteiros não estão cortados do mundo. Têm computador; têm páginas no facebook; televisão e cada monge pode hoje, ter dinheiro e ter o seu telemóvel se assim o desejar e tiver meios para tal. Têm uma saída quinzenal e as refeições são vegetarianas. Os mosteiros recebem uma parte do orçamento do estado, mas os seus orçamentos continuam a ser muito apertados. A educação nos mosteiros versa não só os ensinamentos budistas mas também a fabricação de instrumentos musicais; a informática; o inglês, além de outras matérias. Têm uma relação especial com o silêncio, eles nunca falam para não dizer nada. Se não têm nada a dizer, silenciam. A palavra é usada para dizer alguma coisa de útil ou construtivo.

Não acreditam num Deus criador de tudo e todo poderoso. Para eles a felicidade ou infelicidade depende de cada um de nós. Para ser feliz não devemos esperar que alguém nos dê essa oportunidade, que venha de fora de nós. Devemos criar as condições da nossa felicidade. É um dos princípios do Budismo. O conhecer-se a si mesmo outro. Pois quanto mais nos conhecemos mais facilmente nos distanciamos quando estamos perante uma dificuldade, ou da cólera ou de uma desilusão. Já não ficamos parados, bloqueados nisso. Sabemos que é temporário e passageiro. Isso aprende-se e ensina-se nos mosteiros e nas escolas deste pequeno país.

As pessoas sentem-se muito próximas da natureza, não consideram a natureza como algo de exterior a elas, não perderam a sua ligação com a natureza como as sociedades ocidentais. O Butão é um país rural (2/3 da população vive no campo em pequenas aldeias e 20% na capital) e a natureza está sempre presente. É um povo muito cordial e gentil. Os agricultores trabalham no puro respeito pela natureza e toda a sua agricultura é biológica, trabalhada à mão ou com animais, em socalcos e como adubo usam principalmente estrume de vaca curtido. O país é quase auto-suficiente em frutos e legumes mas o nível de vida dos agricultores ainda é muito baixo. É proibido matar animais por isso a carne vem da Índia. O Butão instituiu 1 dia da semana sem se poder vender álcool (3ª feira) e é proibido fumar nos espaços públicos desde 2004 e a venda de tabaco está proibida, e quem fumar arrisca-se a uma pena de prisão. Quem vender arrisca-se a uma multa e à perca de licença para o estabelecimento comercial, mas ainda assim muitos o fazem às escondidas. O consumo de drogas é altamente reprimido.

O Butão aprendeu com os erros das grandes nações industriais e sempre que fazem um passo para o progresso reflectem sobre se isso os vai tornar mais felizes ou de que modo isso os pode prejudicar. Investem hoje nas infraestruturas de que necessitam preservando a natureza, gerindo tudo isso da forma mais equilibrada possível e com bom senso. Quer ser o primeiro país do mundo a praticar uma agricultura 100% biológica e quer abrir os seus parques nacionais à visitação e lançar-se no turismo verde, mas estabeleceu uma série de medidas para se precaver do turismo de massas. O acesso ao país é encorajado mas cada turista paga uma taxa turística (que é canalizada para pagar a educação gratuita para todos); é registado e extremamente controlado, tendo sempre um guia com ele. O turismo é inteiramente controlado pelo estado e pela monarquia. A industria turística tornou-se  o motor de uma transformação maior, num país tido como um dos mais fechados do mundo e vem estimular uma economia baseada na agricultura e na hidro-eletricidade e ao mesmo tempo dar emprego aos jovens (10% desemprego jovem), cuja demografia está a aumentar. O governo aposta claramente num turismo de elite para ultrapassar as graves dificuldades económicas do país dependente da Índia, mas receia claramente o impacto negativo na cultura tradicional e no meio-ambiente. Actualmente, devido ao Corona virus a entrada de estrangeiros no Butão está suspensa. Todas as conferências e seminários internacionais previstos foram adiados. As escolas e instituições públicas fecharam em Timphu, Paro e Punaka.

Dizem que se fala muito em países sub-desenvolvidos ou em vias de desenvolvimento, mas que é hoje necessário falar em países sobre-desenvolvidos. Na natureza nenhum sistema pode crescer infinitamente. Nos países ditos desenvolvidos criam-se tecnologias para ajudar a recuperar a natureza, mas a noção de rendimento e produtividade passam sempre em primeiro lugar e o tempo torna-se dinheiro. Os butaneses colocam a sua actividade, recursos e energias ao serviço do bem estar dos Homens e de toda a forma de vida.

Mas o Butão sofre hoje, como todos os países, com as alterações climáticas. O degelo em altitude; o caudal dos rios vem diminuindo e os rios estão mais imprevisíveis; deslizamentos de terras. O sector hidro-elétrico é muito importante para eles pois uma parte dos recursos económicos vem da energia elétrica que vendem à Ìndia, mas as chuvas de Inverno são cada vez menores e as pequenas barragens já não têm água suficiente e produzem cada vez menos energia. 

A ideia da FIB (Felicidade Interna Bruta) e os esforços deste pequeno país para evitar os erros do ocidente, fizeram o seu caminho no seio da comunidade internacional e tem levado a reflexões sérias. Hoje em dia muitos se levantam pela defesa do planeta e dos recursos naturais e por um modo de vida mais simples para beneficio de todos. Se não quisermos que no futuro a natureza esteja apenas em museus, e a humanidade seja mais feliz devido à riqueza melhor distribuída, devemos viver hoje de forma mais equilibrada e em harmonia com o planeta que nos abriga. A nossa felicidade depende do nosso respeito para com o planeta, é uma questão de sobrevivência. Talvez reflectirmos sobre o modo de vida deste pequeno país nos faça reequacionar o nosso modo de vida ocidental e agir para mudar o que precisa ser alterado.




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